Crise na Argentina: o que está acontecendo com a Argentina que pode ser uma lição para os brasileiros?
Recentemente muito tem se falado sobre a crise dos países emergentes. Ray Dalio um dos maiores nomes do mercado financeiro de Wall street acredita que a economia americana é uma bomba-relógio que deve detonar nos próximos dois anos e esse movimento teria começado através da crise dos países emergentes, como a Argentina e Turquia. Para ele, a próxima depressão será inflacionária e pode ser acompanhada de uma desvalorização brutal do dólar, que perderia parte da sua reserva de valor e isso “faria a moeda americana ficar numa situação parecida à da lira turca e o peso argentino”
Crise na Argentina
Baseada nessa tese, fui pesquisar “in loco” o que estava acontecendo com a Argentina e o que nós Brasileiros podemos aprender.
Primeiramente, sabemos que muito se fala sobre a crise, mas não sabemos o por quê dela, os fatores dessa crise. Então vamos aos fatos:
Desde os anos 90, a Argentina tem passado por um período de estagnação e crise econômica. A tentativa de uma paridade cambial Dolar x Peso no fim dos anos 90 exauriu as reservas locais e levou a primeira crise em Dezembro de 2001. Após um breve período de “suspiro” na primeira década dos anos 2000, a situação se agravou nos últimos anos, tendo como principal resultado a desvalorização do peso argentino, uma inflação absurda e recorrentes pedidos de ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
Déficit fiscal
Este cenário levou a um déficit fiscal na Argentina, ou seja, os gastos do governo eram maiores que a arrecadação, assim como ocorre atualmente no Brasil (na verdade desde 2014 aqui no Brasil). E em outras palavras, o Déficit fiscal significa que o dinheiro que o governo recebe com taxas, impostos e contribuições não era e não é suficiente para cobrir as despesas de administração e dos investimentos do governo.
Para remediar a situação, foram emitidos títulos da dívida pública, que são como empréstimos que o governo faz e a população ou instituições financiam a dívida soberana. As pessoas / empresas que compram esses títulos, assim como ocorre no Brasil com o Tesouro Direto, fazem um investimento no governo para que ele possa arrecadar recursos e pagar suas contas. Isto é, as pessoas investem o dinheiro nesses títulos com o objetivo de obter lucros. Aqui estamos falando de Juros reais (descontando a inflação).
Cabe ressaltar que a Argentina já passou por um calote recente da dívida em que as renegociações com credores giraram em torno de um pagamento de apenas 40% do valor de face. Existe uma ação coletiva inclusive em tribunal internacional para julgar o mérito.
Taxa de juros
Mas Débora, o que a taxa de juros, títulos públicos tem a ver com a crise na Argentina?
A partir de 2013, durante o governo de Cristina Kirchner, a economia argentina atravessou um período de estagnação, com um crescimento econômico muito pequeno que somado à altas taxas de desemprego, agravou ainda mais a crise fiscal, por que os gastos do governo se tornaram cada vez mais maiores do que a arrecadação. Veja a imagem abaixo do PIB Argentino principalmente após o ano de 2013, como ele se situa muito mais no campo da retração econômica (abaixo de zero) que do crescimento.
Com a estagnação da economia somada ao desemprego, as pessoas começaram a consumir cada vez menos devido a falta de dinheiro ou porque tiveram o poder de consumo corroído pela inflação (atualmente em 55,80% nos últimos 12 meses). Consequentemente, com uma menor movimentação da economia e uma menor arrecadação do governo, a crise fiscal se agravou.
Economia
Todo esse contexto de crise é bem conhecido e parecido com o Brasil. No entanto, ainda não estamos iguais a Argentina principalmente pelo fato de que a Argentina sempre possuiu uma baixíssima reserva de dólares, o que tornou o peso argentino mais desvalorizado. Isso ocorre por que quando o valor do dólar aumenta, o governo não possui uma quantidade de dólares suficiente para os compradores de dólares e, consequentemente, tem que ter mais pesos argentinos para conter o aumento do preço, gastando mais dinheiro.
Somado a isso, a Argentina tem sofrido muito com a estiagem, sem um período longo de chuvas e dessa maneira o setor agrícola obteve uma queda significativa em sua produção. Assim como no Brasil, grande parte das exportações Argentinas são provenientes do setor agrícola, havendo uma grande dependência econômica desse setor. Dessa forma, quando a exportação de produtos agrícolas diminuiu, a entrada de dólares no país caiu significativamente.
Em 2015, o presidente Mauricio Macri com uma vertente mais liberal foi eleito e desde então, implementou um plano de ajuste fiscal com grande cortes de gastos expressando uma tentativa de diminuir a dívida argentina e obter um superávit primário.
E o que é um ajuste fiscal?
Nada mais é do que um corte de gastos públicos. Com a redução de gastos do governo e o aumento de tributação o governo Macri captou uma grande impopularidade e atualmente está apenas com 5% de aprovação, assim como o presidente Michel Temer era impopular no Brasil há alguns meses atrás.
O atual ajuste fiscal realizado pelo governo argentino tem sido feito também por meio do corte de subsídios, diversos programas sociais como o bolsa família no Brasil, redução do auxílio na energia elétrica, transporte público, gás e com implementação de imposto sobre exportações e do corte de verbas ministeriais.
O compromisso assumido por Macri perante o FMI foi reduzir a participação do Estado na economia, redução dos gastos do governo e diminuir o déficit fiscal. Dessa maneira, o governo pretendia diminuir a dívida pública argentina, o que diminuiu o crescimento ano após ano.
Entendendo a taxa de juros:
O Governo ao emitir títulos do governo precisa te remunerar. Tal remuneração é feita através da taxa de juros. Dessa forma, a taxa de juros nada mais é que o preço do dinheiro incluindo o risco de não recebimento que a pessoa corre por emprestar dinheiro ao Estado.
A taxa de juros do país é dependente de dois fatores: da taxa de juros dos Estados Unidos, pois o dólar é a moeda de referência no mundo, e também o conhecido “risco país” que medido pelas empresas de rating e representa o risco que aquele país possui em não pagar sua dívida.
Dívida pública
Na Argentina, a dívida pública está tão alta que as agências de risco já acreditam que o país irá dar calote, ou seja, elas acreditam que o governo não conseguirá mais pagar seus credores, Assim, aumenta significativamente o “risco país” e consequentemente o custo da dívida. Os juros que o governo precisa pagar a quem detém o título da dívida aumentam, e novas rolagens da dívida vêm com taxas cada vez maiores também.
Sendo assim, só compensa para um comprador de título/ dívida argentina adquirir um título com risco de não pagamento se houver uma “recompensa” (o juro) muito alta. O que reflete atualmente a taxa de 65% de juros, a mais alta do mundo.
Investidores
Nesse contexto, os investidores internacionais venderam os seus títulos argentinos receosos, de não receberem o valor que investiram. Esse movimento é conhecido como “fuga de capitais”, o que acarreta um agravamento sobre o fluxo de dinheiro e se torna ainda mais difícil fazer a economia voltar funcionar.
Para você ter ideia de como a taxa de juros e a crise argentina está grave, no Brasil, mesmo com uma crise econômica, a taxa juros é de 6,5% e nos EUA 1,75%. E mesmo com essa taxa de juros de 65% ao ano, a moeda local continua a se desvalorizar, e o país não consegue atrair recursos externos, e nem mesmo consegue evitar o efeito dominó da fuga de capitais.
Paralelamente, como consequência de uma taxa de juros tão alta, houve uma recessão na atividade industrial e econômica, pois a taxa de juros também é utilizada como referência para empréstimos tornando inviável para os empresários realizarem investimentos.
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Consequências da Crise na Argentina
Sem investimentos nas empresas e recessão, a economia fica estagnada o que traz mais desemprego e diminuição da renda da população, que acaba consumindo menos. E assim temos o efeito dominó.
Outra consequência das altas taxas de juros é o aumento de preços, fazendo que os argentinos passem a fazer compras em mais de 5 mercados a procura de preços menores e também a queda no consumo. Devido à instabilidade econômica, muitos empresários e produtores passam a retirar suas empresas e fábricas de um país, fazendo com que mais dinheiro saia do país.
Com a fuga de capitais e a baixa reserva de dólares, o peso argentino ficou completamente desvalorizado, sendo 1 dólar equivalente a 45 pesos argentinos, agravando inflação nos produtos produzidos no exterior.
Países Emergentes
Quase todas as moedas de países em desenvolvimento sofreram uma forte desvalorização frente ao Dólar devido o aumento da taxa de juros dos EUA, que atraiu muitos investidores em busca da estabilidade de pagamento que os títulos americanos possuem.
No entanto, a queda do peso argentino em relação ao dólar foi a maior entre todos os países emergentes desde o início deste ano. E devido a esse problema, a Argentina decidiu pedir mais uma vez ajuda ao Fundo Monetário Internacional – FMI.
Em junho de 2018, a Argentina recebeu do FMI 50 bilhões de dólares em um acordo de financiamento com duração de 36 meses acompanhado das medidas de controle de gastos do governo, o que foi altamente impopular, pois As medidas de austeridade para reduzir o déficit fiscal da argentina impactaram as áreas sociais, como na educação, saúde e previdência,
Somada a alta da inflação, o fraco poder de compra da população, aumentou-se um índice alto de pobreza para o país. Com as medidas indicadas pelo FMI, a população enfrenta um novo estado de vulnerabilidade social, sem acesso à serviços básicos.
Eleições argentinas 2019
As eleições presidenciais da Argentina irão ocorrer ainda em 2019 e devido a todos os fatores expostos a popularidade de Macri despencou a 5%, o que aponta que provavelmente não terá chance de ser reeleito, mesmo com o apoio de alguns governadores das províncias para que suas políticas continuem sendo postas em ação.
No entanto, Cristina Kistner mesmo não sendo candidata a presidência, porque enfrenta vários processos, se candidatou como a vice do partido opositor a Macri, com grandes chances de ser eleita e a crise se agravar cada vez mais, pois a mesma disse que os cortes de gastos sugeridos pelo FMI teriam que ser renegociados.
Concluindo
Este artigo serve para mostrar que um estado que não controla as contas públicas e com um alto índice de gastos, como o Brasil atualmente, também tem grandes chances de sofrer uma crise similiar da atual na argentina. E a primeira medida para o Brasil frear o aumento de gastos públicos todos os anos acima da inflação é passar a Reforma da previdência.
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