Capital de Giro: É mesmo tão importante?

Olá, caro leitor e leitora do Dica de Hoje 7. Meu nome é Patrícia Rossari e hoje vamos conversar sobre um assunto importante na análise de negócios. É algo relativamente simples na teoria, porém na prática necessita de processos ajustados e de um planejamento financeiro que compreenda as peculiaridades do negócio, que não se pode alterar tempo de suprimento de matéria-prima essencial só porque a gestão “acha” que fazer caixa dá mais poder de negociação em qualquer tipo de negócio… Enfim.

O capital de giro

Destaco de início que o capital de giro é fundamental para que você entenda se a empresa que estás analisando tem uma situação financeira equilibrada, se ela consegue, através do seu processo principal, gerar valor e os fluxos suficientes e em simetria com as saídas desses valores, afinal, tudo tem uma origem e uma aplicação, porém a origem não pode ser mais onerosa do que aquilo que o processo tem condições de gerar através da aplicação.

E isso vale não somente para quantias, mas também para os tempos. Imagine um negócio que investe bilhões em um novo projeto. Obviamente ele financia esses recursos (origem) e isso tem custo (oneroso). Esse projeto terá um tempo de maturação (aplicação do recurso), porém a dívida já existe e precisa ser paga, logo, a distribuição dos fluxos de saída (pagamento da dívida) devem estar de acordo com os fluxos de entrada, ou pelo menos organizados de maneira que a empresa seja capaz de honrar os pagamentos até que o projeto destrave valor. Fique atento, afinal, existem empresas que têm uma receita crescente, maior que os custos, mas que não conseguem manter as contas em dia devido aos fluxos.

No caso de aquisições, como por exemplo das empresas de saúde, onde os negócios adquiridos já funcionam, fica mais fácil de organizar os fluxos, e com isso a alavancagem fica sob controle.

Vamos falar um pouco da origem do termo citado por Eugene Brigham e Michael Ehrhardt. Eu sei que não é nenhuma novidade para a maioria, mas caso algum leitor ou leitora não esteja familiarizado:

“O termo capital de giro originou-se do velho vendedor ianque que carregava a sua carroça para, então, sair vendendo as suas mercadorias. A mercadoria era chamada de capital de giro porque era exatamente isso que ele vendia, ou fazia “girar” para produzir seus lucros. A carroça e o cavalo eram seus ativos permanentes. Ele geralmente era o dono do cavalo e da carroça, portanto, ambos eram financiados com capital próprio, no entanto, o ambulante tomava emprestados os fundos para comprar a mercadoria. Esses empréstimos eram denominados empréstimos de capital de giro e tinham de ser reembolsados depois de cada viagem para demonstrar ao banco que o crédito era seguro. Se o vendedor conseguisse pagar o empréstimo, o banco poderia conceder outro, e dizia-se que os bancos que seguiam esse procedimento estavam empregando ‘práticas bancárias justas’.”

Podemos citar também a clássica obra e vastamente usada como exemplo para explicação do termo, The Wealth of Nations – A Riqueza das Nações – Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações – escrito por Adam Smith em 1776, onde ele cita que:

Os bens de um comerciante não lhe dão rendimento nem lucro até que os venda por dinheiro, e esse dinheiro de nada lhe serve senão quando novamente trocado por mercadorias. O seu capital sai continuamente sob uma forma, voltando de novo sob outra, sendo esta circulação, estas trocas sucessivas, que lhe trazem lucros. Este capital pode, portanto, muito propriamente denominar-se ‘capital circulante’. É este o conjunto de valores que, no dia a dia do negócio, permite o pagamento de dívidas, constituindo, sem dúvida, o grupo mais importante de rubricas em qualquer balanço. Pode, pois, dizer-se que o ativo corrente consiste naqueles valores que na evolução normal do negócio, pelos sucessivos passos de compra, produção e venda, se vão rotativamente transformando em dinheiro, permitindo o pontual pagamento de dívidas”.

O capital de giro precisa ser analisado de acordo com as peculiaridades de cada negócio/setor, não adianta acreditar que será da mesma maneira em um varejo e em uma empresa de agronegócio, além do que vai depender também das premissas macro estabelecidas no período e da situação do negócio em seu ciclo de vida (em crescimento, maduro, declínio, etc.). O mais comum é avaliar pela teoria clássica, quanto menor a necessidade de capital de giro, menores serão os riscos da empresa em relação à liquidez, porém isso não significa rentabilidade.

Explicando: quando o negócio possui um PMR (Prazo Médio de Recebimento) maior que o PMP (Prazo Médio de Pagamento), ela precisa buscar recursos para custear a operação, ou seja, para financiar o processo operacional. Logo, aqui, o risco precisa considerar, além das variáveis regulares de operação, também o custo desse financiamento.

O capital de giro tem base em dois aspectos: operacional e financeiro.

  1. Operacional tem base no tempo que a empresa emprega na atividade até que receba o valor pelo que vendeu. Ou seja, desde a matéria-prima, fornecedores, a estocagem, a produção, venda e recebimento. Aqui tu defines os dias que a empresa teve entre a compra das mercadorias e o pagamento do fornecedor, dias em estoque, dias entre a venda e recebimento das vendas.
  2. Aqui o tempo significa o dinheiro e se o fluxo de entrada ocorre antes ou depois do fluxo de saída (recebimento x pagamento). Se a empresa paga o fornecedor, mas recebe só 30 dias após o pagamento, nesses 30 dias existe necessidade de capital de giro.

NCG = Prazos Médios de Recebimento – Prazos Médios de Pagamento

Resumindo:

PMP = (Fornecedores/Compras) x 360 ou 30

Quanto maior, melhor.

PMR = (Contas a Receber/Receita Líquida) x 360 ou 30

Quanto menor, melhor.

PME = (Estoque/CMV) x 360

Quanto menor, melhor.

Para contextualizar com relação à importância da conta estoque na análise, a empresa informa no ITR o ciclo econômico, se aumentou ou diminuiu o tempo de estoque. Aliás, é essencial prestar atenção a isso:

Estoque médio = (estoque inicial do período + estoque final do período) / período escolhido (mês ou ano). Depois a empresa calcula o prazo médio de estocagem. Essa análise de tempo de armazenagem é relacionada com a capacidade que a empresa tem de espaço e também se o custo não está alto demais e exige redução para não comprometer o capital de giro.

É natural que a maioria das empresas mantenha algum estoque, mas aqui o diferencial entre bons e maus resultados é a gestão desse estoque, giro, cobertura, controle de excedentes, perdas, ou seja, o tempo que você permanece com o produto até vender, o que acontece com ele caso você não o venda, e o tempo que tem para pagar por ele. Essa é uma variável importante em relação à geração de valor, a importância do ciclo econômico.

Então, o cálculo do capital de giro se baseia nos investimentos que o negócio faz  no curto prazo (circulante), e a gestão adequada das contas que contribuem para o resultado do capital de giro deve ocorrer em todas as etapas do processo, isso porque a lógica é que o retorno desse investimento seja maior que o custo do capital aplicado sobre a operação, e aqui entra a questão do que é mais viável para o negócio, capital próprio ou de terceiros.

Mas cuidado, lembre-se que o dinheiro em caixa não é a origem do recurso a ser aplicado, ele tem origem no passivo. Portanto, não é/deveria ser algo considerado como um investimento. Assim, o uso do caixa (recurso) deve ser feito sempre pensando na geração de valor do processo principal do negócio. Seguindo esse raciocínio fica mais claro o argumento de que volume em caixa não significa necessariamente geração de valor operacional, afinal, ela deveria estar usando esse valor na operação principal, se não está usando é porque não necessita de capital de giro devido a um ciclo econômico favorável que deixa negativa a necessidade de capital de giro, ou então é porque o processo de geração de valor não está crescendo, afinal, se a atividade está evoluindo é natural existir maior necessidade de recursos alocados para financiar a operação.

Eu poderia resumir da seguinte forma: o capital de giro é o resultado de como a gestão trabalha a liquidez do negócio, a gestão das contas a receber, as contas a pagar (fornecedores), estoques e outros passivos de curto prazo que estejam relacionados com o capital que vai ser utilizado para rodar o processo, custear a safra, etc.

E tudo começa onde? Na origem dos recursos, nos fornecedores. Então, olho vivo nas estratégias que o negócio possui para melhorar o relacionamento com a cadeia de fornecimento, medidas mais eficientes de abastecimento, controles de qualidade aplicados, etc., afinal, você sabe que os negócios hoje se destacam pela eficácia da cadeia logística (tanto que as últimas aquisições de grandes negócios foram justamente empresas de tecnologia logística), pelo relacionamento com o fornecedor, que determina a estratégia do estoque, evita perdas, aumenta margem e lucros, pela forma como a entrega é feita, respeitando os pilares essenciais da logística: Tempo, Lugar e Qualidade.

É preciso um giro de estoque adequado, um custo de estoque reduzido e uma gestão que priorize um sistema de KPIs que monitore as demandas dos clientes, para então usar essas informações junto à cadeia de fornecedores, ou seja, integração com o fornecedor para que as previsões de demanda sejam mais adequadas à realidade e, assim, evitar custo desnecessário com estoques excedentes. Por exemplo: um negócio que vende bem, mas sem valor agregado, sem otimização dos estoques, sem uma gestão EFICIENTE da distribuição, com falhas no modelo de marketplace (nos varejos), tende a não apresentar resultados efetivos.

Obs.: importante ressaltar que devido ao cenário atual – COVID-19, paradas das indústrias, desemprego (recuo da renda), restrição da circulação – a demanda por produtos não essenciais tende a recuar, e negócios com ineficiências operacionais acabam sentindo ainda mais.

Não que o contas a receber não seja igualmente importante, ele é e muito, e aqui, foco na precificação do negócio, medidas adotadas pela organização para se adequar às necessidades da demanda atual por exemplo, entendimento de regiões, custos alocados, etc.

E por fim, mas não menos importante, olho no estoque. Pode parecer sem sentido, mas empresas podem sim quebrar por erros com estoques, seja pela falta de matéria-prima a um preço adequado ou por excesso de material pronto, gerando custo e obsolescência que não podem ou são muito difíceis de serem recuperados.

Então, quando você ler um material sobre algum negócio ou quiser empreender em algo, observe com cuidado e atenção essas contas, pois não são apenas números, são o primeiro reflexo de uma boa ou má gestão de recursos.

Daniel Nigri com apoio de Patricia Rossari

O analista Daniel Nigri CNPI1810 é o responsável pelas informações perante a ICVM 598

As informações não constituem recomendação de compra ou venda de qualquer ativo

Aproveite o para assinar o Dica Beginner e outros planos da Área de Membros , clique aqui para conferir.

Já participa do nosso grupo do Telegram?

Videos, informações e novidades vem aí.

Link do grupo

 

ASSINATURAS

CURSOS

INSTITUCIONAL

LEGAL