Não basta apenas ler a chamada da matéria da revista/jornal, e decidir a estratégia
somente com essa informação, ou ficar o dia todo no WhatsApp
buscando alguém que pense como você, para justificar a sua decisão.
Vamos usar um exemplo para contextualizar, traçando um paralelo com um livro de Luigi Pirandello, publicado em 1926 em Florença, com o título original – Uno, nessuno e centomila, podemos perceber inúmeras semelhanças entre o comportamento do protagonista Moscarda e de alguns investidores em renda variável.
Para quem ainda não leu o livro, desde já recomendo, quem já leu provavelmente já sabe de quais semelhanças estou falando. Vou fazer um breve resumo do assunto do livro, para que vocês entendam porque alguns investidores se comportam como o protagonista, o autor da obra foi prêmio Nobel de literatura em 1934, a obra trata de autoimagem, e como os comentários externos produzem efeitos absurdos, por vezes danosos em nossos atos, e em suas consequências posteriores a ação.
No livro o protagonista não encara muito bem uma observação da esposa, que diz que o nariz dele é desproporcional (torto), e isso é o estopim para todo o enredo, isso porque a partir da observação da esposa, ele então percebe que todas as pessoas possuem uma imagem dele diferente, seja o nariz torto ou qualquer outra característica, e isso o confunde imensamente em relação a sua própria definição, quem é afinal Moscarda? Ele se vê então obrigado a conviver com mais de uma percepção de si mesmo, embora não possa abrir mão do que de fato ele é. Um tanto filosófico, concordo.
O mais genial da obra é a insistência do autor na constatação de que muitas vezes o personagem se limita àquilo que os outros decidem como verdade sobre ele, além do fato de que ele percebe que é inútil falar, pois cada um ouve e entende como quer e somente o que acha viável, ou seja, só o que lhe convém. Para mudar esse drama a que foi submetido em relação a autoimagem e aceitação, ele decide então que será completamente diferente de tudo o que pensam, mas não consegue, e por fim acaba usando o caminho mais óbvio – não olhar no espelho e continuar em autonegação.
Com certeza você já percebeu porque eu citei no início, que existem semelhanças entre Moscarda e o alguns investidores em renda variável que usam a emoção, ao invés da razão para decidir investimentos.
Tudo começa com alguma indicação, no caso do investidor seria aquele ativo que iria mudar a vida, lucro certo, 5000%, coloque todo seu patrimônio e fique milionário sem esforço, mas então ele percebe ou alguém o avisa que algo pode estar “torto” e não sair exatamente como ele planejou, ou como a propaganda do ativo vendeu. Então posteriormente ele percebe que mais pessoas enxergam o ativo de forma diferente, então ele fica confuso e com medo, afinal investiu todo o patrimônio em um único ativo que iria deixá-lo milionário, mas pensado bem ele imagina que nada pode dar errado, e decide falar para as pessoas que aquele ativo é ótimo pois disseram isso pra ele.
É o momento torcedor!
Provavelmente, algumas pessoas entenderão isso do mesmo jeito que ele e comprarão o ativo, na emoção da perspectiva de se tornar milionário, outras pessoas dirão que ele é maluco em fazer isso e que provavelmente não irá se transformar em um milionário e sim em um miserável, ao apostar tudo em uma promessa na renda variável. Ou seja, ele fica confuso novamente e então decide pela emoção – vende tudo com prejuízo e promete nunca mais investir em renda variável, afinal o mercado é apenas um jogo de azar.
Mas, como na história, a autonegação é mais forte, então após o ativo que ele vendeu com prejuízo voltar ao preço que estava, quando ele comprou anteriormente, decide que foi tudo um engano, e volta a comprar no topo, afinal é mais fácil não olhar no espelho do que encarar que fizemos bobagem, principalmente quando se trata de dinheiro.
Pense e responda, qual é a sua reação se um ativo apresenta prejuízo ou queda no lucro por mais de um trimestre, e ele está na sua carteira com um preço médio bem acima da cotação atual, qual sua reação?
Fica feliz no início e depois entra em pânico, comprando mais e mais e mais e mais para “baixar o preço médio”, dizendo a todos que aquilo não é importante, na tentativa de tranquilizar a si mesmo, e fica por meses na operação de “pegar a faca caindo”? Mas faz tudo isso sem saber muito bem o motivo pelo qual está fazendo?
Analisa os resultados e calcula o preço justo do ativo, de acordo com as novas projeções de cenário micro e macro, então decide a estratégia de manter e aportar, somente manter, ou vender?
Simplifica, vende tudo no prejuízo (depois de ter feito muito PM)?
Reclama em todos os grupos de WhatsApp, culpando os que disseram que era uma boa compra?
Ou acredita que os prejuízos. ou quedas no lucro não são importantes, porque mercado é tão eficiente que ele vai reconhecer a beleza que só tu vê no ativo?
E em qualquer análise de médio/longo prazo, analise também os gestores do negócio, as estratégias antes que resultem em números, afinal o que caracteriza a competência são a integração e a coordenação de um conjunto de habilidades, conhecimento e atitudes que na sua manifestação produzem uma atuação diferenciada, essas ações são estratégias e tem como objetivo traçar ações que minimizem o efeito da competição e maximizem seus próprios resultados, e análise qualitativa busca encontrar no mercado um posicionamento estratégico que permite estar à frente de seus pares, e só uma boa gestão é capaz de fazer isso.
Muitas pessoas dizem que é impossível ter conhecimento sobre isso, na verdade não é impossível, pois não diz respeito a estar dentro da empresa, mas ter bom senso e conhecimento para analisar e concluir se faz sentido o planejamento com os retornos estimados, então caso você não conheça o setor, converse com alguém que entenda, pesquise, envie e-mail para o RI, pesquise os gestores em seus trabalhos anteriores, seu desempenho, etc.
O que não faz sentido é colocar o seu dinheiro em algo que você não conhece, e mais risco ainda é colocar todo seu dinheiro em um único setor, só porque agora está tudo bem, não esqueça que negócios são dinâmicos. A coragem não é a ausência do medo, mas é a maturidade para saber o que precisamos fazer, sem deixar o comodismo ou a frustração por erros passados nos paralisar. A insistência, persistência em obter o sucesso só é eficaz quando usamos as ferramentas certas, quando somos conscientes das nossas limitações e responsáveis o suficiente para admitir quando precisamos mudar a estratégia.
“Antes de fazer alguma coisa , pense , quando achar que já pode fazê-la , pense novamente.”
Até a próxima semana.