B2W – BTOW3: A maior operação logística do varejo brasileiro

Análise de Negócio

Insegurança e mercado de capitais são elementos que não combinam, são a mistura responsável pela alta taxa de mortalidade de investidores no mercado de renda variável. Existe a insegurança por não ter experiência no mercado e existe aquela resultante do “investimento de expectativa”: eu monto a operação porque acho que vai subir, monto uma operação vendida porque acho que vai cair e assim por diante. Caiu está “barata”, ou, subiu, então só pode ser boa!

A gestão da carteira de investimentos é fundamental para diminuir a taxa de mortalidade, e não se trata de prever o futuro, mas sim de entender que dados quantitativos e qualitativos de empresas não são imutáveis e necessitam de adaptações de estratégias, isso porque os fatores que compõem a análise mudam de acordo com o cenário externo, sejam circunstâncias contempladas pela política monetária, seja de retração ou de expansão, onde cada negócio apresenta fatores que mudam a análise, seja de compra de um novo ativo, de aporte, de venda ou de aguardar para saber o que fazer. O famoso: na dúvida, opte por não fazer bobagem.

Por fim, um dos fatores mais importantes quando se fala de análise fundamentalista é compreender que valor e preço não são inimigos, ambos são informações essenciais para decidir se um investimento é viável, quando será viável e se continua sendo viável.

Para refrescar a memória:

As Lojas Americanas (LAME4) iniciaram esse case, que já teve momentos difíceis, e colocaram à prova a capacidade logística e de resultado da companhia. Eu considero um dos cases mais claros para demonstrar a importância do processo logístico no resultado das empresas. Para a marca ser aceita pelo cliente, para que seja a “preferida” e possa prosperar, e assim obter maior lucratividade, precisa estar em sintonia com todos os elos da cadeia, os parceiros estratégicos. Somente assim o cliente receberá o produto que comprou, na data contratada, pelo preço negociado e com a qualidade esperada. Isso é o que torna realidade a tão desejada fidelização.

A Lojas Americanas (LAME4) foi fundada em 1929, no Rio de Janeiro, e teve como seu primeiro slogan: “Nada além de dois mil réis”. Muita história aconteceu… e em 1999 surge a Americanas.com, o início da força do comércio eletrônico no país através dos grandes varejos que já possuíam lojas físicas, o que obviamente facilitou muito a expansão do negócio on-line. E em 2006 surge a B2W Companhia Global do Varejo, fruto da fusão com o Submarino.com. Para que vocês tenham uma ideia do tamanho do negócio, na época as duas representavam mais de 70% de mercado atendido, porém é importante destacar que eram empresas diferentes, com estratégias e projetos diferentes de negócio. Enquanto a Americanas tinha uma operação física que nunca teve intenção de abandonar, o foco do Submarino era apenas o gerenciamento do e-commerce, através de processos mais ágeis e enxutos, já compreendendo que esse seria o grande diferencial no futuro, com cada dia mais concorrência. As coisas ficaram confusas durante alguns anos (com pico da confusão em 2010, com os transportadores). Após 2014, com o aumento das vendas on-line, ela entendeu a necessidade de investir mais na logística de distribuição e adquiriu empresas transportadoras especialistas em comércio eletrônico.

Um belo exemplo de case que fez uma fusão estratégica sensacional no início da expansão do mercado on-line, mas não deu a devida importância ao processo logística do e-commerce, e acabou aplicando o que já fazia na cadeia física, e isso consumiu tempo e dinheiro, mas não trouxe resultados positivos.

Hoje o negócio possui um dos maiores portfólios de marcas, com baixa sobreposição de clientes, e atua nas seguintes frentes:

  • E-commerce (1P);
  • Marketplace (3P) (Americanas.com, Submarino, Shoptime);
  • Serviços de crédito ao consumidor: Submarino Finance e Digital Finance; pagamentos, crédito e serviços financeiros através da Ame;
  • Plataforma de tecnologia;
  • Soluções de logística, distribuição e atendimento ao cliente.

Outro ponto importante de análise nesse case é o marketplace, visto que a margem é maior, não consome muito caixa (não precisa adquirir ou manter em estoque os produtos), a empresa já possui a tecnologia e o sistema pronto para um relacionamento adequado com o cliente, além de gerar muito mais tráfego, devido ao portfólio maior e,, consequentemente muito mais cliques e mais potencial de receita para a rede.

E também iniciou no ano passado o projeto Americanas Mundo, estilo Alibaba, onde a maioria dos produtos são chineses e americanos, o varejo cross-border, que já faz muito sucesso no mundo inteiro, e por aqui não é diferente. Nesse projeto piloto a empresa disponibiliza 200 mil itens, mas o objetivo é mais audacioso: até 2025, o objetivo é chegar a mais de R$ 5 bilhões em vendas, o que seria em média 8% das vendas brutas totais do negócio, com base nas projeções atuais.

Uma das perguntas mais frequentes em relação a esse case de negócio é a seguinte: se não existe lucro e ela queima caixa, como a precificação desse ativo está crescente? O que o mercado enxerga no negócio?

Primeiro, é preciso dizer que o projeto está focado em aumentar, expandir o negócio, o que obviamente aumenta os custos/despesas, ou seja, o lucro fica mais difícil, além da concorrência ser grande (Amazon e Mercado Livre), o que obviamente contribui.

OBS: em 2019 a empresa aumentou capital: R$ 2,5 bilhões.

Mas o mercado enxerga a ideia de consolidação do marketplace, e essa não é a primeira tentativa (quem acompanha a empresa sabe disso). Mas se o projeto der certo, ela pode se transformar em um negócio que, se bem gerido, usa pouco caixa, permite uma margem elevada e consolida de vez a plataforma, que de fato vai gerar o valor, e isso tudo como a gigante que é, o que representa um adicional nos números quando as coisas dão certo (já falamos sobre efeito no lucro quando existe um movimento na margem de varejo).

Sabemos que inovar é uma necessidade, e que sem investimentos não existem novos projetos, ou seja, a economia e o consumo são dinâmicos, logo, os negócios também devem ser. Se dará certo, se essa precificação do mercado é justificada, só o tempo dirá. De qualquer maneira, considere o risco real, que é de um projeto audacioso, que depende de uma logística ajustada para gerar todo seu potencial de valor.

Mas para que o lucro exista é preciso uma operação bem estruturada, ágil, com gestões dos parceiros (marketplace) eficientes, onde a cadeia não seja comprometida com gargalos devido aos parceiros, produtos sem estoque, entregas demoradas e assim por diante. Ou seja, não adianta maximizar o fluxo, encarecendo os custos de distribuição, se a cadeia não funciona desde o início.

Lembrando que a empresa já opera as seguintes modalidades:

O2O (Online to Offline) – “Tudo. A toda hora. Em qualquer lugar.”, esse modelo é o mesmo usado pelo Grupon. O objetivo é usar a plataforma on-line para atrair os potenciais clientes para o consumo na loja física. No 1T20, o GMV vindo dessa estratégia de negócio foi de R$ 530 milhões, aumento de 85% em relação ao mesmo período de 2019, através das iniciativas:

  • Click and Collect Now – em até uma hora a retirada
  • Ship from Store – compra e recebe em até duas horas
  • Click and Collect – compra on-line e retira na loja física
  • Prateleira Infinita – venda nas lojas para os produtos da plataforma digital

A empresa cita ainda que em relação ao prazo de entrega no 1T2020, que é uma variável importantíssima que define compras e que a concorrência usa como gatilho de venda,  mais de 50% de todas as compras realizadas nos sites (1P e 3P) e enviadas pela LET’S (plataforma de gestão compartilhada dos ativos de logística e distribuição)  foram entregues em até 2 dias e 60% das entregas para os estados do Rio de Janeiro e São Paulo foram realizadas em até 2 dias (1P e 3P).

A companhia conta com 18 Centros de Distribuição espalhados pelo Brasil: RJ, SP, MG, PE, PA, SC e RS.

E a empresa conta também com a B2W Entrega, que opera e controla as entregas de 96% da base total de sellers do marketplace, representando cerca de 80% dos pedidos na modalidade. São diferentes tipos de serviços, cada qual com seu preço:

  • Fulfillment: armazenagem e entrega (aqui é interessante observar que são 595 sellers com estoques operados pela plataforma. Isso afeta o prazo de entrega e, obviamente, os valores de frete são mais competitivos).
  • Através do B2W Fulfillment o cliente obtém a melhor experiência de compra, onde todo o processo logístico (estoques, transporte e atendimento) é operado pela B2W.
  • Pick Up – Grandes Operações onde é retirado o produto no CD do seller e entregue.
  • Direct Collect: retirada do produto no CD do seller – Médios e Pequenos + delivery).
  • Drop Off Hub: seller entrega em um dos hubs da Direct e entrega.
  • Drop Off Loja: seller entrega em uma das Americanas e entrega.

Resumindo o marketplace:

Basicamente, a modalidade traz um retorno elevado com investimento relativamente pequeno, afinal, quanto maior o mix de produtos e variedade ofertada de preços, maior será a quantidade de pessoas que acessam a plataforma. Consequentemente, a probabilidade de compra aumenta, além da margem ser maior nesses casos. O público atingido aumenta, decorrente dessa gama diversificada de opções disponíveis. Quando você pesquisa um produto no buscador ou no site da loja, vários dos que aparecem na listagem são vendidos na modalidade marketplace, inclusive com a opção de dois ou mais fornecedores com preços e datas de entregas diferentes. Ou seja, opções maiores de escolha para o cliente e mais acessos para a plataforma, e quanto mais vendas, maior a rentabilidade.

Veja os números em relação à estratégia comercial da companhia:

  • O número de itens ofertados nos sites totalizou 31,7 milhões ao final do 1T20, + 248% na comparação com o 1T19, impulsionado pelo marketplace. O sortimento do marketplace cresceu 257%: no 1T2019 eram 8,8 milhões de itens e no 1T2020 são 31,4 milhões.
  • O número de visitas aos sites e apps atingiu 659 MM no 1T20, crescimento de 45% na comparação com 1T19.
  • O número de pedidos cresceu 35% na comparação com 1T19, devido ao aumento na frequência de compra e novos clientes.
  • Número de clientes ativos (doze meses): 17 milhões, sendo 2 milhões de novos clientes no período.
  • O tráfego por dispositivos móveis representou 81,6% do total de visitas, + 9,7 p.p. na comparação com o 1T19.
  • Foram 73,7 milhões de downloads dos apps das marcas desde os seus lançamentos.
  • E 11,7 milhões de downloads no 1T20.
  • GMV Marketplace cresceu 24,5%, chegando a R$ 2.728 milhões e participação de 59,8% no GMV Total.
  • No trimestre, foram 8,6 mil sellers, aumento de 2,2x em relação ao 1T2019. No final de 2019 eram 46,8 mil; no final do 1T2020 são 55,4 mil sellers.
  • O sortimento do B2W Marketplace registrou crescimento de 257%, saindo de uma base de 8,8 milhões de itens no 1T19 para 31,4 milhões de itens ao final do 1T20.

Outros fatores importantes (não apenas esses) que devem ser observados em cases de varejo, inclusive nas Lojas Americanas (LAME4), que é dona de 61,43% da B2W:

  • CMV é influenciado pelo volume, que é afetado pela política de estoques/projeções (relação direta com o giro de estoques);
  • PMR (Prazo Médio de Recebimento) precisa ser analisado sempre, principalmente quando a empresa está tendo problemas com a concorrência ou está com estoques elevados e, assim, entender o que está acontecendo de fato;
  • Mesma lógica para o PMP (Prazo Médio de Pagamento), isso porque o ciclo econômico precisa estar de acordo com a realidade do negócio, e boas empresas têm uma boa gestão de compras e controle de estoque com previsões eficientes, evitando assim comprometer capital desnecessário;
  • Preste atenção no prazo médio de estocagem, ele diz muito sobre a situação do mercado consumidor e o quanto a empresa entendeu a realidade, além, obviamente, de como ela faz a gestão nesses cenários. A relevância na composição do estoque no custo total é grande, e isso afeta diretamente as margens e influencia o retorno aos acionistas. Não possuir controle de estoque ou um giro elevado que cause perdas por avarias, ociosidade, interfere no lucro. Ou seja, analisar o comportamento dessa conta nos documentos é essencial para perceber o custo de oportunidade adotado pela empresa;
  • Analise a geração de caixa operacional e livre (exemplo: comprometimento do capital de giro com estoques aumentando sem crescimento da demanda).

Resumo dos números do 1T2020

GMV Total: R$ 4.558 milhões, +27,3% em relação ao 1T2019

Capital de Giro: -23 dias, melhora de 43 dias na comparação com o 1T2019

Receita Bruta: R$ 2.105,4 milhões, + 30,9% em relação ao 1T2019

Receita Líquida: R$ 1.696,2 milhões, + 32,3% em relação ao 1T2019

Lucro Bruto Ajustado: R$ 526,9 milhões, + 29,2% em relação ao 1T2019

Margem Bruta Ajustada: 31,1%, contra 31,8% no 1T2019

SG&A Ajustadas: R$ 399,3 milhões, contra R$ 324,6 milhões no 1T2019

EBITDA Ajustado: R$ 127,6 milhões, +53,3% em relação ao 1T2019

Margem EBITDA Ajustada: 7,5%, contra 6,5% no 1T2019

Resultado Financeiro Líquido: R$ 110 milhões negativos, – 29,5%

Resultado Líquido: Prejuízo de R$ 108,0 milhões, contra também prejuízo de R$ 139,2 milhões no 1T2019, redução de 22,5% no prejuízo

Margem líquida: -6,4%, contra -10,9% no 1T2019

Capex: 3,6% do GMV total

OBS: GMV é Gross Merchandising Volume, vendas de mercadorias próprias, vendas realizadas no marketplace e outras receitas (excluindo a comissão das vendas do marketplace), após devoluções e incluindo impostos.

Sobre a dívida da companhia, acompanhe os números na imagem abaixo, retirada do release do 1T2020:

Concluindo

Os números foram retirados do release da companhia, disponível no site de relações com investidores, assim como as informações referentes às estratégias utilizadas pela empresa. E analisando ambas em conjunto com as demais informações qualitativas referentes ao setor e à logística que foram disponibilizados no texto, é possível perceber que a ideia está clara, o foco bem definido e que o mercado espera resultados, por isso precifica o que o negócio ainda pode entregar.

Analisar cases de negócio, que é meu trabalho, e não precificar, diz respeito a entender o quanto a empresa já fez para alcançar suas metas e principalmente o que falta para ela chegar lá, e pela DRE já percebemos que ela aumenta receita, mas aumenta o custo em percentual maior, logo, estamos falando de ajustes, de eficiência em gestão de custos.

Em relação à Covid-19, a empresa cita que trabalhou a páscoa on-line (1,5 milhões de ovos vendidos), ampliou o Ship from Store, além de ampliar a oferta de itens essenciais e de primeira necessidade (álcool em gel, higiene, alimentos, bebidas). A companhia cita também que a aquisição do Supermercado Now, no início do ano, ajudou no processo, visto que ela ganhou escala e expertise justamente quando as vendas desses produtos aumentaram, e na semana passada a empresa anunciou uma parceria com o BIG para integração da plataforma de vendas, ou seja, as lojas (376 de diversas bandeiras) pertencentes ao BIG poderão ser conectadas e vender seus produtos nas plataformas do Supermercado Now e Americanas Mercado, conforme comunicado da empresa no dia 13/05/2020.

Lembrando que isso não é recomendação de compra ou venda, e que os resultados que constam nesse material foram retirados do site RI da companhia.

Daniel Nigri com apoio de Patricia Rossari

O analista Daniel Nigri CNPI1810 é o responsável pelas informações perante a ICVM 598

As informações não constituem recomendação de compra ou venda de qualquer ativo

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