Até onde o dólar vai subir

Começamos o ano com um janeiro muito volátil no mercado global.

Tudo começou com tensão entre EUA e Irã, que causou um certo barulho no mercado, e mesmo a assinatura da 1ª fase do acordo comercial entre Estados Unidos e China não foi capaz de trazer calmaria, já que o Coronavírus veio trazendo uma forte turbulência.

Consequentemente, janeiro jogou uma pá de cal no otimismo comum de início de ano nos ativos de risco ao redor do mundo.

Tradicionalmente, começamos o ano otimistas e os economistas, principalmente os que são de países emergentes projetavam crescimento global próximo a 3%, assim como no Brasil. Desta forma, janeiro, que é um mês que normalmente é marcado pelo otimismo com economias emergentes, neste ano especialmente foi reflexo de maior aversão ao risco.

Sendo assim, é impossível ignorar o impacto do Coronavírus na economia global. Boa parte dos analistas estima que a atividade chinesa (e global) deve cair frente às expectativas anteriores, em torno de 0,5% a 1,0%. Essa possível retração já diminui a demanda por commodities e vem também provocando uma queda significativa nos preços do petróleo: WTI e Brent caem quase 18% em 2020.

No Brasil, em janeiro não tivemos uma agenda doméstica que pudesse segurar toda essa aversão mundial aos ativos de risco, e o mercado secundário da B3 perdeu cerca de R$19,1 bilhões em investimentos estrangeiros, que buscam países “mais seguros”, a maior fuga no mês de janeiro em anos.

E para agravar o cenário de aversão ao risco, o IPCA de janeiro bem abaixo do que se esperava, sendo 0,21% vs 0,35% que era estimado. Consequentemente, ajudou a derrubar as expectativas relacionadas à inflação para final de 2020.

E o que explica esse dólar alto em janeiro?

O desemprego interno passa longe de causar pressão inflacionária, petróleo reduzindo custo, a curva de juros no Brasil vem diminuindo e acaba pressionando a taxa de câmbio pela fuga de capital estrangeiro. Foram R$ 19 bilhões.

E fevereiro?

Para entender o dólar é importante contextualizar o cenário político-econômico em fevereiro.

Há uma tempestade perfeita para a redução das expectativas com a atividade doméstica.

Além do IPCA, o IBC-Br de dezembro veio abaixo do que se esperava, que somados aos dados recentes já apresentados, como os números ruins de varejo e serviços de novembro e dezembro, há um grande risco que isso se repita  para o primeiro trimestre de 2020, o que vai impactar diretamente o PIB de 2020.

Os economistas esperam também um déficit em conta corrente (CAD) de US$ 11,4 bilhões em janeiro, muito acima do déficit de janeiro em 2019 (US$ 8,9 bilhões), o que resultará em um déficit em 12 meses de US$ 53,3 bilhões (2,9% do PIB), contra o resultado de US$ 50,8 bilhões em 2019 (2,8% do PIB).

Para agravar, o Coronavírus vem a cada dia diminuindo as estimativas de crescimento global e o PBoC (Banco Popular da China) já anunciou redução de taxa de juros, como um incentivo para conter a queda econômica do país.

Para entender se isso pode influenciar a direção do dólar, temos que averiguar se este movimento do banco central chinês pode desencadear algum tipo de mudança na política monetária americana.

Outro ponto interessante é que a relação entre taxa de câmbio e risco-país era diretamente proporcional entre 2009-2015, e após 2016 tem chamado a atenção pelo descasamento entre os indicadores.

Como falei em um artigo anterior, a pergunta de um milhão de dólares ainda é:

Por que o nível de risco-país não reflete a previsibilidade do fluxo de capitais estrangeiros aqui no Brasil?

Para termos a resposta dessa pergunta, temos que olhar para o passado e observar que o FED (Banco Central Americano), no intuito de recuperar a economia por conta da Crise do Subprime em 2008, determinou que a taxa básica de juros americana (Fed Fund Rate) seria próxima a 0% até 2015.

Dessa maneira, toda a atratividade em investimentos nos títulos públicos americanos diminuiu e tivemos um enorme fluxo de capitais, que migrou para países com taxas de juros mais interessantes.

No entanto, a partir 2016 tivemos uma série de eventos que ocorreram simultaneamente nas economias americana e brasileira:

O primeiro foi a diminuição da política de estímulos monetários (quantitative easing) nos EUA pela elevação do Fed Fund Rate, seguido pelo fato de o Brasil ter perdido o último Grau de Investimento, o que desencadeou uma enorme saída de dólares do Brasil, já que a partir deste momento tanto as taxas de juros dos EUA estavam mais atrativas quanto vários fundos estrangeiros não possuíam mais o mandato para alocar recursos no Brasil por conta da queda de rating de crédito pela Moody´s.

O impeachment de Dilma Roussef desencadeou uma forte redução dos níveis de risco-país, uma vez que o mercado não dava qualquer tipo de credibilidade ao antigo governo em solucionar os problemas fiscais do Brasil.

Dessa forma, a partir desse momento tivemos uma ruptura no fluxo de capital estrangeiro, que antes era de acordo com a relação risco-país, passando a dar mais relevância para o diferencial de juros que as políticas monetárias de ambos os países pode provocar.

Acompanhando a linha desse raciocínio, estamos observando a queda na taxa Selic e vendo o nosso histórico juro real despencando vertiginosamente nos últimos anos. No entanto, apenas em meados de 2018 os EUA retornaram para juros reais positivos.

Dessa forma, esses dois fatores fizeram despencar a diferença de juros reais entre Brasil e EUA: se a média dos últimos 10 anos era de 4,9%, a diferença em janeiro de 2020 ficou em 0,8%.

Logo, podemos concluir que é natural que uma saída de capitais estrangeiros venha acontecendo na economia brasileira, e assim temos uma menor oferta de dólar e consequente desvalorização do real.

Tendo em vista que o atual cenário de Coronavírus afeta mais os mercados em ativos de risco se a epidemia for controlada e avançarmos quanto à 2ª fase do acordo comercial, o dólar pode cair.

E o que fazer?

Não tente adivinhar para onde o dólar vai, porque até mesmo os melhores economistas erram nessa projeção.

Enquanto esse cenário de indefinição permanecer, faça algum tipo de proteção ou investimento em dólar na sua carteira enquanto aguardamos as cenas dos próximos capítulos.

Debora Toledo

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