Recentemente, o COE (Certificado de Operações Estruturadas) voltou aos holofotes, reacendendo discussões sobre sua estrutura e eficácia como investimento. Esse produto financeiro sempre gerou controvérsias. Apesar de ser regulamentado e oferecer a possibilidade de exposição a diferentes ativos, muitas vezes com proteção parcial ou total do capital, sua complexidade e os custos embutidos levantam questionamentos sobre seu real benefício.
Hoje, quero compartilhar minha visão sobre esse produto e explicar por que não recomendo COEs. Afinal, você realmente entende como ele funciona?
O Que é um COE?
O COE é um instrumento financeiro que combina renda fixa e renda variável. Regulamentado no Brasil desde 2014, ele é inspirado nas Structured Notes, populares nos EUA e Europa. Sua estrutura é composta por dois elementos principais:
- Renda fixa: Parte do capital é investida em títulos de renda fixa para garantir, parcial ou totalmente, o valor investido.
- Derivativos de renda variável: Outra parte é usada em ativos como ações, índices e moedas, buscando retornos mais altos.
COE Realmente Garante o Capital Investido?
Muitos COEs são vendidos como “investimentos seguros”, pois prometem devolver o capital investido. Mas como isso funciona na prática?
Imagine que você invista R$ 10.000 em um COE. O banco pode usar 90% desse valor (R$ 9.000) para comprar um título público com vencimento em 5 anos, pagando IPCA + 7% ao ano. No vencimento, esse montante cresce o suficiente para devolver seu capital investido.
Os 10% restantes (R$ 1.000) são usados para “apostar” em ativos de maior risco. Se essa parte gerar lucro, você ganha um retorno extra. Se der prejuízo, ao menos você recebe o capital inicial de volta.
Mas há problemas:
- Seu dinheiro fica preso até o vencimento, sem liquidez.
- Em 5 anos, seu capital poderia ter rendido muito mais investindo diretamente em renda fixa a IPCA + 7%.
- Estruturas de COE variam bastante, e algumas podem não garantir 100% do capital investido.
Um Exemplo Ilustrativo
Agora, imagine um COE atrelado ao índice Nasdaq, ao peso chileno e às ações do Google. O vendedor diz algo como:
“Essa é uma daquelas oportunidades que você simplesmente não pode perder! Imagina ter a chance de lucrar com três grandes ativos, sem precisar escolher um único ativo e sem perder noites de sono acompanhando o mercado! Ou seja, você tem uma estratégia sofisticada e diversificada, aproveitando tendências globais e sem precisar se preocupar com as oscilações diárias do mercado. Com um produto estruturado assim, não faz sentido ficar de fora. Afinal, quem não quer participar dos ganhos do mercado com um risco controlado?”
Parece tentador, não é? Mas na prática, muitas dessas estruturas limitam os ganhos e têm regras complexas que podem reduzir sua rentabilidade.
Modalidades de COE
- Valor Nominal Protegido: Garante que você não perca o capital investido, mas pode ficar sem rentabilidade.
- Valor Nominal em Risco: Você pode perder parte ou todo o capital investido, dependendo da performance dos ativos atrelados.
Tributação
Os COEs seguem a tabela regressiva do Imposto de Renda da renda fixa:
- Até 180 dias: 22,5%
- De 181 a 360 dias: 20%
- De 361 a 720 dias: 17,5%
- Acima de 720 dias: 15%
Por Que Não Recomendo COEs?
Apesar da aparência sofisticada, COEs têm diversos pontos negativos:
- Baixa Liquidez: O resgate só ocorre no vencimento ou em janelas específicas, limitando sua flexibilidade.
- Custos Embutidos: Bancos e corretoras incluem taxas na estrutura do COE, reduzindo sua rentabilidade real.
- Complexidade: É difícil entender exatamente como os retornos são calculados. Isso pode levar investidores a tomar decisões mal informadas.
- Retornos Limitados: Mesmo que o mercado suba muito, os COEs geralmente têm tetos de ganho, restringindo o potencial de lucro.
- Ausência de Cobertura do FGC: Alguns COEs são compostos por ativos que poderiam estar cobertos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC) se fossem adquiridos separadamente. No entanto, dentro da estrutura do COE, essa proteção não existe.
Estudos e Dados Reais
Dois estudos da Fundacão Getulio Vargas (FGV) levantaram questionamentos sobre a eficácia dos COEs:
- 90% dos COEs analisados tiveram retornos esperados inferiores ao Tesouro Direto.
- A complexidade estrutural mascara custos elevados e riscos, prejudicando a transparência.
- A falta de clareza faz com que muitos investidores escolham o produto sem compreendê-lo completamente.
Além disso, a alta comissão paga aos vendedores pode gerar um conflito de interesses, incentivando a comercialização mesmo quando o COE não é adequado ao perfil do cliente.
Conclusão
COEs podem parecer atrativos, mas é essencial entender sua estrutura antes de investir. Se seu objetivo é diversificar sua carteira, vale a pena considerar alternativas mais simples, transparentes e com custos menores.
Se você já investe em COE ou está pensando nisso, faça um teste: tente explicar, com detalhes, como ele funciona, quais são os riscos e os custos envolvidos. Se conseguir fazer isso com clareza e sentir-se confortável, talvez ele faça sentido para você. Caso contrário, talvez seja hora de buscar opções mais eficientes.
Afinal, nem sempre o sofisticado é o melhor caminho. Muitas vezes, é na simplicidade que encontramos os melhores resultados.
Abaixo os dois artigos da FGV com o estudo publicado.
https://eesp.fgv.br/noticia/coe-e-roubada-mesmo-e-esse-estudo-da-fgv-mostra-por-que
Até a próxima!
Julia Bastos Chagas Priante – @julia.priante Engenheira de Alimentos pela Universidade Federal de Viçosa, atua no mercado financeiro desde 2006. Especialista em Investimentos (CEA) e cursando MBA em Planejamento Financeiro, auxilia famílias a alcançarem seus sonhos por meio de um planejamento financeiro estruturado e personalizado.
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