Nos debates sobre Bitcoin, dois extremos costumam dominar a conversa: os maximalistas que vêem a criptomoeda como o único ativo digno de existência e os céticos que a consideram uma bolha fadada ao colapso. No meio desse embate, existe um espaço negligenciado: o da alocação racional e moderada. Poucas pessoas percebem que possuir apenas uma pequena fração de Bitcoin pode ser uma decisão altamente sensata e, paradoxalmente, transformadora para um portfólio.
A maioria dos investidores que rejeita o Bitcoin o faz sob a premissa de que ele é volátil demais, que não possui valor intrínseco ou que sua adoção em massa é incerta. Essas preocupações são válidas, mas ignoram um ponto essencial: o tamanho da posição importa mais do que a certeza absoluta sobre o futuro do ativo.
Ter 50% ou 100% do patrimônio em Bitcoin pode ser um risco inaceitável para muitos, mas alocar entre 1% e 5% é algo que a maioria pode suportar. Nesse nível, mesmo que o ativo caia a zero, o impacto será pequeno. Mas se o Bitcoin continuar subindo ao longo das próximas décadas, essa alocação moderada pode ter um efeito assimétrico positivo no portfólio.
Dados recentes: Bitcoin vs. outros investimentos
Para ilustrar o ponto, olhemos para os últimos cinco anos:
- O Bitcoin subiu 000% em dólar.
- O dólar subiu 40% no mesmo período.
- O Ibovespa subiu apenas 7%.
- O S&P 500 em reais teve um desempenho impressionante de 160%.
- O CDI, que representa a renda fixa brasileira, teve um retorno acumulado de 52%.
O que isso significa para um investidor? Se você tivesse trocado R$1.000 por dólares há cinco anos e comprado Bitcoin, teria hoje R$15.400. Já no dólar, o mesmo investimento teria virado R$1.400. Quem investiu no CDI teria R$1.520 e no Ibovespa apenas R$1.070.
Agora, vamos pensar em quem seguiu uma estratégia conservadora com uma pequena exposição em Bitcoin:
- Carteira 95% CDI e 5% Bitcoin: Rendeu 121,4% no período, resultando em R$2.214 para um investimento inicial de R$1.000.
- Carteira 95% Ibovespa e 5% Bitcoin: Rendeu 78,65%, resultando em R$1.786,50.
Se o Bitcoin tivesse ido a zero, como seria o impacto? Surpreendentemente pequeno:
- A carteira 95% CDI e 5% Bitcoin ainda teria rendido 44,4% (R$1.444).
- A carteira 95% Ibovespa e 5% Bitcoin teria subido 44,4% (R$1.444), praticamente igual ao CDI.
Nassim Taleb, que já foi defensor do Bitcoin antes de se tornar um crítico, popularizou o conceito do “Efeito Lindy“: quanto mais tempo algo sobrevive, maior a chance de que continue existindo. O Bitcoin já passou por ciclos de pânico, repressão regulatória e ataques institucionais e ainda está de pé, acumulando mais tempo de vida e reforçando a tese de que não é tão efêmero quanto parecia em 2010 ou 2015.
Além disso, investidores com skin in the game tendem a acompanhar melhor o ativo. Quem possui uma pequena quantia de Bitcoin tem um incentivo para entender seus fundamentos, a dinâmica da oferta limitada, a segurança da rede e o impacto da política monetária tradicional sobre ele. Esse conhecimento adicional pode levar a decisões financeiras mais informadas no geral.
O argumento mais convincente para uma pequena alocação em Bitcoin é que ele funciona como um hedge contra um colapso sistêmico. Moedas fiduciárias já tiveram histórias de hiperinflação e perda de valor abrupta. Embora o dólar, o euro ou o real pareçam seguros hoje, a história financeira está repleta de exemplos de moedas que se tornaram obsoletas ou extremamente desvalorizadas.
Conclusão
O Bitcoin não precisa ser uma religião nem um ativo marginalizado. Ele pode ser apenas mais um componente inteligente dentro de uma carteira bem balanceada. A idéia de que “ou se é maximalista, ou se é cético” é falsa. Existe um meio-termo racional, onde uma pequena exposição pode trazer benefícios significativos.
Em um mundo onde grandes transformações podem surgir de pequenas mudanças, talvez a chave não seja apostar tudo no Bitcoin, mas sim reconhecer que ter um pouco pode ser muito.
Grande abraço,
João Pedro Mello
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