Transporte no Brasil – Custo versus Eficiência
O Brasil percebeu, há algumas semanas, a importância do transporte na vida cotidiana. Da batata que subiu de preço pela escassez do produto na feira até o combustível que não chegava aos postos, desencadeando uma série de eventos sucessivos que irá refletir nos próximos resultados das empresas.
Transportar cargas e pessoas é tão antigo quanto à invenção da roda. A gestão de transportes compreende qualquer tipo de deslocamento por qualquer um dos modais existentes, de um ponto a outro, no tempo aceitável e concordado, no local correto e em condições de uso/consumo e integridade física no caso do transporte de pessoas. Parece simples, mas não é.
É de conhecimento geral que no Brasil o modal Rodoviário é o mais utilizado, motivo pelo qual houve tantas consequências resultantes da greve dos caminhoneiros. E porque esse modal é o mais utilizado? Será mais barato, eficiente, confiável? Ou será simplesmente porque não existem opções viáveis entre os demais modais? Isso significaria dizer que as empresas são dependentes de uma única infraestrutura de transporte?
Vale lembrar que tudo começou em 1957 com a implantação da indústria automobilística no país, que impulsionou o desenvolvimento do modal rodoviário no Brasil. Antes disso a intenção das rodovias era integração com as ferrovias.
Modais – Formas de transporte utilizadas
Para entendermos melhor a gravidade da situação quando falamos do impacto do custo de transporte nos resultados da empresa, precisamos conhecer um pouco mais sobre os modais disponíveis e a sua estrutura de custos versus desempenho.
Existem cinco modais básicos de transporte: dutoviário, hidroviário, ferroviário, rodoviário e aéreo. Aqui vamos falar sobre o mais utilizado e o que deveria ser mais utilizado, ou seja, rodoviário e ferroviário. E como os investimentos ou a falta deles pode afetar os resultados das empresas que você investe.
Ferroviário: transporte lento e de longas distâncias, de preferência com cargas fechadas de ordem extrativa, por exemplo:
- Fechados: Produtos que não podem ser expostos ao tempo, granéis sólidos, ensacados;
- Fechado para granéis corrosivos e granéis sólidos que não podem ser expostos ao tempo;
- Abertos para os granéis que podem ser expostos ao tempo;
- Isotérmico: Produtos congelados em geral;
- Plataforma: contêineres, siderúrgicos, grandes volumes, produtos que exijam grandes espaços;
- Tanque: cimento a granel, derivados de petróleo claros e líquidos não corrosivos.
Aqui os custos fixos também são altos e os variáveis mais baixos. É fato que quando se trata de transportar cargas completas a longa distância nada supera o baixo custo do modal ferroviário. Hoje, infelizmente, dados da CNI mostram que 30% da malha ferroviária está inutilizada e 23% sem condições de operar. Vale lembrar que os contratos com as concessionárias datam da década de 90 e muitos dos problemas são consequência dessa forma de concessão. Como, por exemplo, a falha de investimento em melhorias e ampliação da malha para um atendimento mais eficaz da demanda, inclusive possibilitando integração, a intermodalidade para produtos que hoje são exclusivamente transportados via modal rodoviário.
São cargas frequentes do modal ferroviário:
Em relação aos custos entre os modais ele só não é mais barato que o modal hidroviário e é o que gera menos perdas e danos nas mercadorias / pessoas transportadas, e mesmo assim os volumes não tem demonstrado crescimento ao longo do tempo devido ao pouco investimento que viabilize a utilização.
Rodoviário: nesse modal a composição basicamente se refere a produtos acabados e semi acabados e com tamanhos de carga médias, inferiores ao modal ferroviário. Nossa malha é imensa, mas muito deficitária pela falta de manutenção e investimento. Os estados que se destacam positivamente nas condições de uso são: São Paulo e o Paraná.
O início dessa expansão rodoviária se deu na década de 50 com a implantação da indústria automotiva, até então a ideia principal das rodovias era a integração com as ferrovias para utilizar a intermodalidade. Hoje no Brasil temos:
É fato que esse modal possui vantagens, sendo a principal delas flexibilidade do serviço em termos geográficos (maior alcance) e a possibilidade de entregar lotes pequenos em distâncias curtas. Além do fato de não exigir a intermodalidade, ou seja: a entrega ocorre no destino sem nenhuma parada ou transferência. O que gera comodidade, rapidez e conveniência. Quando o assunto é o tamanho do investimento necessário podemos afirmar que é pequeno, afinal as estradas são financiadas e mantidas com dinheiro público, mas os custos variáveis são altos (combustível, manutenção, etc.).
Logo, a lógica de que transportes longos (maiores do que 800 km) devem ser feitos por esse modal não é verdadeira. Isso porque os custos com o transporte tem a tendência de serem maiores que a receita advinda do frete. Por isso, a estratégia em longas distâncias seria usar a integração com a ferrovia ou a cabotagem.
Investimento em Infraestrutura e a Relação com os Custos do Negócio
Existe pouco investimento em infraestrutura no Brasil. E, considerando que a maior parcela do custo é resultado da distribuição e transporte das cargas, é óbvio que isso interfere negativamente no lucro das empresas. O custo operacional com transporte que era estimado em 24,9% no ano de 2016 em 2017 subiu para 27%. Isso representa um percentual grande nas contas de qualquer negócio.
Para contextualizar, um estudo divulgado pela Confederação Nacional do Transporte denominado de “Acidentes Rodoviários e a Infraestrutura” mostrou que em 2017 foram registrados no país 90 mil acidentes em rodovias federais, o que resultou em um custo aproximado de R$ 10,8 bilhões aos cofres públicos. Detalhe: aqui que esse valor é maior do que a união conseguiu investir nas rodovias. Nessa mesma pesquisa foi constatada uma queda na qualidade do estado das rodovias, sendo que a classificação de regular, ruim ou péssima chegou a 61,8%, sendo que em 2016 era 58,2%. Em 2017, 38,2% das rodovias estavam em bom ou ótimo estado, enquanto que em 2016 eram 41,8%; ou seja, está piorando.
Nos últimos dez anos mais de um milhão de acidentes e 83 mil mortes ocorreram. A confederação contabiliza uma média de 21 mortes por dia ou um óbito por hora. Lembrem que estamos falando do modal que é responsável por mais de 60% do transporte de cargas e pessoas.
Investir em infraestrutura é uma necessidade para que ocorra crescimento econômico. Isso porque quando a economia aquece mais produtos são produzidos, e isso exige a ampliação das malhas e integração entre elas para uma maior eficiência na infraestrutura de transporte. Mas, dados da CNT relatam que em 2011 os investimentos públicos federais em infraestrutura rodoviária foram de R$ 11,21 bilhões. Já no ano de 2016 o investimento foi de R$ 8,61 bilhões, mesmo valor investido em 2008.
Concluindo
A greve que parou o país é apenas uma amostra da nossa fragilidade estrutural, das falhas geradas por investimentos equivocados e mal aplicados, pelas concessões desastrosas no modal ferroviário, pela falta de incentivos às empresas para que busquem alternativas que fomentem novas possibilidades e diminuam essa dependência absurda de um único modal em um país com uma capacidade gigante de produção agrícola e industrial. Para demonstrar a necessidade de evoluir nessa questão observe esses dados:
Durante o período da greve, os prejuízos superaram 34 bilhões de reais para a indústria. O setor pecuário teve um prejuízo de cerca de 8 bilhões e o varejista de 5 bilhões. Esses números devem servir de alerta para que os investimentos em infraestrutura e a intermodalidade sejam devidamente valorizados e o país supere essa dependência excessiva de um único modal. Somos um país produtor e industrializado, mas infelizmente continuamos com uma estrutura arcaica e deficitária, incapaz de agregar valor aos nossos produtos, fazendo que as empresas percam produtividade e nossa economia cresça em um ritmo muito lento.
Patrícia Rossari
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