Gerou menos caixa, o capital de giro pesou na conta?

Vamos conversar sobre um assunto importante na análise de negócios. É algo relativamente simples na teoria, porém na prática necessita de processos ajustados e de um planejamento financeiro que compreenda as peculiaridades do negócio. E se tu assites vídeos no YouTube, vai ver um festival de análises de negócios e a expressão: piorou o resultado de geração de caixa porque exigiu mais capital de giro na operação.

Vou usar um exemplo de estratégia da gestão em relação ao capital de giro, que pode causar problemas sérios: alterar tempo de suprimento de matéria-prima essencial só porque a gestão “acha” que fazer caixa dá mais poder de negociação em qualquer tipo de negócio, em qualquer cenário.

Mas apenas com um exemplo fica difícil de entender, né? Então vamos ao básico, porque é sempre por aí que começamos.

O capital de giro é fundamental para que você entenda se a empresa que tu estás analisando possui uma situação financeira equilibrada, se ela consegue, através do processo principal, gerar valor e se os fluxos são suficientes e em simetria (entradas e saídas), afinal, tudo tem uma origem.

“Os bens de um comerciante não lhe dão rendimento nem lucro até que os venda por dinheiro, e esse dinheiro de nada lhe serve senão quando novamente trocado por mercadorias. O seu capital sai continuamente sob uma forma, voltando de novo sob outra, sendo esta circulação, estas trocas sucessivas, que lhe trazem lucros. Este capital pode, portanto, muito propriamente denominar-se ‘capital circulante’. É este o conjunto de valores que, no dia a dia do negócio, permite o pagamento de dívidas, constituindo, sem dúvida, o grupo mais importante de rubricas em qualquer balanço. Pode, pois, dizer-se que o ativo corrente consiste naqueles valores que na evolução normal do negócio, pelos sucessivos passos de compra, produção e venda, se vão rotativamente transformando em dinheiro, permitindo o pontual pagamento de dívidas”.

The Wealth of Nations – A Riqueza das Nações – Uma Investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações – escrito por Adam Smith em 1776.

Porém, a origem não pode ser mais onerosa do que o processo tem condições de gerar através da aplicação.

E isso vale não somente para valores, mas também para os tempos.

Imagine um negócio que investe bilhões em um novo projeto. Obviamente ele financia esses recursos (origem) e isso tem custo (oneroso). Esse projeto terá um tempo de maturação (aplicação do recurso), porém, a dívida já existe e precisa ser paga. Logo, a distribuição dos fluxos de saída (pagamento da dívida) deve estar de acordo com os fluxos de entrada, ou pelo menos organizados de maneira que a empresa seja capaz de honrar os pagamentos até que o projeto destrave valor.

Fique atento! Afinal, existem empresas que têm uma receita crescente, maior que os custos, mas que não conseguem manter as contas em dias devido aos fluxos.

No caso de aquisições, como por exemplo, das empresas de saúde, onde os negócios adquiridos já funcionam, fica mais fácil de organizar os fluxos, e com isso a alavancagem fica sob controle.

O capital de giro precisa ser analisado de acordo com as peculiaridades de cada negócio/setor. Não adianta acreditar que será da mesma maneira em um varejo e em uma empresa de agronegócio, além do que, vai depender também das premissas macro estabelecidas no período e da situação do negócio em seu ciclo de vida (em crescimento, maduro, declínio, etc.). O mais comum é avaliar pela teoria clássica: quanto menor a necessidade de capital de giro, menores serão os riscos da empresa em relação à liquidez. Porém, isso não significa rentabilidade.

Explicando: quando o negócio possui um PMR (prazo médio de recebimento) maior que o PMP (prazo médio de pagamento), ele precisa buscar recursos para custear a operação, ou seja, para financiar o processo operacional. Logo, aqui o risco precisa considerar, além das variáveis regulares de operação, também o custo desse financiamento.

O capital de giro tem base em dois aspectos, operacional e financeiro.

  1. Operacional: tem base no tempo que a empresa emprega na atividade até que receba o valor pelo que vendeu. Ou seja, desde a matéria-prima, fornecedores, a estocagem, a produção, venda e recebimento. Aqui tu defines os dias que a empresa teve entre a compra das mercadorias e o pagamento do fornecedor, dias em estoque, dias entre a venda e recebimento das vendas.
  2. Financeiro: aqui o tempo significa o dinheiro, e se o fluxo de entrada ocorre antes ou depois do fluxo de saída (recebimento x pagamento). Se a empresa paga o fornecedor, mas recebe só 30 dias após o pagamento, nesses 30 dias existe necessidade de capital de giro.

Para contextualizar, com relação à importância da conta estoque na análise, a empresa informa no ITR o ciclo econômico, se aumentou ou diminuiu o tempo de estoque. Aliás, é essencial prestar atenção a isso:

Estoque médio = (estoque inicial do período + estoque final do período) / período escolhido (mês ou ano). Depois a empresa calcula o prazo médio de estocagem. Essa análise de tempo de armazenagem é relacionada com a capacidade que a empresa tem de espaço e também se o custo não está alto demais e exige redução para não comprometer o capital de giro.

É natural que a maioria das empresas mantenham algum estoque, mas aqui o diferencial entre bons e maus resultados é a gestão desse estoque, giro, cobertura, controle de excedentes, perdas, ou seja, o tempo que você permanece com o produto até vender, o que acontece com ele caso você não venda e o tempo que tem para pagar por ele. Essa é uma variável importante em relação à geração de valor, a importância do ciclo econômico.

E não faltaram exemplos na pandemia, de empresas que ficaram sem estoques e ainda estão. E outras que compraram muito mais que o normal e não conseguiram colocar tanto produto no mercado.

Então, o cálculo do capital de giro se baseia nos investimentos que o negócio faz no curto prazo (circulante), e a gestão adequada das contas que contribuem para o resultado do capital de giro deve ocorrer em todas as etapas do processo, isso porque a lógica é que o retorno desse investimento seja maior que o custo do capital aplicado sobre a operação, e aqui entra a questão do que é mais viável para o negócio: capital próprio ou de terceiros.

Mas cuidado, lembre que o dinheiro em caixa não é a origem do recurso a ser aplicado – ele tem origem no passivo. Portanto não é/deveria ser algo considerado como um investimento. Assim, o uso do caixa (recurso) deve ser usado sempre pensando na geração de valor do processo principal do negócio.

Seguindo esse raciocínio fica claro que volume em caixa não significa geração de valor operacional, afinal, ela deveria estar usando esse valor na operação principal. Se não está usando, é porque não necessita de capital de giro, devido a um ciclo econômico favorável que deixa negativa a necessidade de capital de giro. Ou então é porque o processo de geração de valor não está crescendo, afinal, se a atividade está evoluindo é natural existir maior necessidade de recursos alocados para financiar a operação.

Eu poderia resumir da seguinte forma:

O capital de giro é o resultado de como a gestão trabalha a liquidez do negócio, a gestão das contas a receber, as contas a pagar (fornecedores), estoques e outros passivos de curto prazo que estejam relacionados com o capital que vai ser utilizado para rodar o processo, custear a safra, etc.

Então, olho vivo nas estratégias que o negócio possui para melhorar o relacionamento com a cadeia de fornecimento, medidas mais eficientes de abastecimento, controles de qualidade aplicados, etc., afinal, você sabe que os negócios hoje se destacam pela eficácia da cadeia logística (tanto que as últimas aquisições de grandes negócios foram justamente empresas de tecnologia logística), pelo relacionamento com o fornecedor, que determina a estratégia do estoque, evita perdas, aumenta margem e lucros, pela forma como a entrega é feita, respeitando os pilares essenciais da logística.

É preciso um giro de estoque adequado, um custo de estoque viável, um sistema de KPIs que monitore as demandas dos clientes, para então usar essas informações junto à cadeia de fornecedores, ou seja, integração com o fornecedor para que as previsões de demanda sejam mais adequadas à realidade e, assim, evitar custo desnecessário com estoques excedentes. Por exemplo: um negócio que vende bem, mas sem valor agregado, sem otimização dos estoques, sem uma gestão EFICIENTE da distribuição, com falhas no modelo de market place (nos varejos), tende a não apresentar resultados efetivos. Lembrou de uma gigante de varejo, né?

O contas a receber é igualmente importante. Aqui, foco na precificação do negócio, medidas adotadas pela organização para se adequar às necessidades da demanda atual, por exemplo, entendimento de regiões, custos alocados, etc.

Então, quando você ler um material sobre algum negócio, ou quiser empreender em algo, observe com cuidado e atenção essas contas. Não são apenas números, são o primeiro reflexo de uma boa ou má gestão de recursos.

Obs.: Importante ressaltar que devido ao cenário atual – COVID-19, paradas das indústrias, desemprego (recuo da renda), restrição da circulação – a demanda por produtos não essenciais tende a recuar, e negócios com ineficiências operacionais acabam sentindo ainda mais.

Não importa quanto você sabe, ou que informação você possui, se não souber como e quando deve usá-los.

Até a próxima semana.

Plano Dica Beginner

ASSINATURAS

CURSOS

INSTITUCIONAL

LEGAL